2.12.02

Oito ou Oitenta

Na semana passada fomos agraciados com uma baleia simpática que deu um show digno de Sea World, só que gratuito, nas nossas águas. Poxa, eu nunca consigo ver essas coisas! Só por fotos, e fiquei maravilhado com os pulos que ela deu. Aqui é mesmo uma cidade maravilhosa, onde recebemos os visitantes mais ilustres do mundo: baleias, golfinhos e pingüins de cada altíssima latitude da terra.




Que inveja desse banhista!



Mas o Rio é um cidade oito ou oitenta.

Segunda-feira. Acordo e como de costume corro pra porta pra pegar o jornal. Leio as manchetes da parte de cima e quando viro pra ver as de baixo, tomo um susto: Bando faz arrastão na Pedra da Gávea. Cinco homens armados com facas e armas de fogo ameaçaram trilheiros e levaram dinheiro, tênis, celulares, câmeras fotográficas e até mesmo alianças. Fiquei pensando como seria se eu e meus amigos estivéssemos lá: voltaríamos sem uma filmadora digital, 2 câmeras digitais e pelo menos 4 botas de trilheiros. Tremi de pena de quem estava lá, imagine só o que eles perderam. Senti ódio e ao mesmo tempo um grande alívio.

O primeiro, porque é uma covardia assaltar em trilhas. Estrangeiros estavam lá e irão voltar chocados para seus países. Uma menina, que subia a primeira vez, disse que essa foi a primeira e última. Coitada, não pôde apreciar a paisagem que se descortinava lá de cima, a mata atlântica exuberante e a linda imagem talhada na pedra durante os anos.

O segundo sentimento, alívio, foi porque há quase dois meses eu subia a Pedra da Gávea à noite pra pernoitar lá em cima, repousando ao observar múltiplas estrelas cadentes e sendo despertado pelo rosado do céu que se antecipa ao nascer do sol, que se erguia pelos mares cariocas, imagem belíssima gravada na minha mente. Pude fazer tudo isso tranqüilamente, sem temer um arrastão feito por pessoas medíocres.

Agora já não posso acreditar que subirei com a mesma tranqüilidade. Meu grande amigo que gentilmente me convida a apreciar o passeio na Pedra da Gávea, enviou-me prontamente um email, dizendo: "Voltaram os arrastões que me fizeram parar de subir a Pedra da Gávea vinte anos atrás".

Não consigo nem pensar que meu programa favorito para dias lindos possa ser deixado de lado por esse motivo. É claro que durante os próximos meses, vai imperar a hipocrisia: autoridades fazendo pingue-pongue com a responsabilidade da segurança nas trilhas e um temporário policiamento no local para mostrar serviço. Depois que as pessoas esquecerem disso - pelo menos os que não fazem essa trilha ocasionalmente, ou que nunca foram lá - volta tudo como era antes e os assaltos serão comuns, até que a trilha seja cortada dos roteiros ecoturísticos cariocas.

Espero que isso não aconteça, porque será uma dor muito grande para mim e para outros trilheiros como eu, que tanto amam a Pedra da Gávea e suas dádivas naturais. O Rio é assim: cidade oito ou oitenta. Enquanto a beleza é inigualável, a segurança (atualmente) é inimaginável.

Nenhum comentário: